quinta-feira, 3 de novembro de 2011

A história que a gente conta

A gente nunca conta as coisas como elas realmente aconteceram. É inerente ao ser humano (principalmente ao ser humano apaixonado, ou magoado) mudar a versão dos fatos que acontecem na própria vida, pra ver se, de alguma forma, dói menos. A gente inventa frases que não foram ditas e apaga verdades que não gostou de ouvir. Cria intimidades que não existiram, ou supervaloriza algo vazio, preenchendo com todo o amor e comprometimento que gostaríamos que tivesse existido, mas que não existiu. A gente passa pela fase de se culpar pelo que não deu certo, passa pelo período de tentar achar respostas e, quando vê que nada disso vai funcionar, simplesmente aceita e faz o mais fácil: escreve uma história pra contar pros outros, e até pra gente mesmo.


Uma das coisas mais difíceis de terminar um relacionamento é ter que contar pros outros. A mesmas história já começa com três versões: a sua, a do seu respectivo e a verdadeira. Dali por diante, esse número só aumenta. Sua família vai saber de coisas que seus amigos não vão, e ainda assim isso pode variar, porque tem gente que confia nos pais, nos irmãos - mas tem gente que não. Dentre os amigos, para cada um, um detalhe que vem e um detalhe que se vai. Não é que você não confie, mas aquele seu amigo previu sua relação do começo ao fim, e hoje, você não quer lhe dar o gostinho de saber que ele estava certo. Quem sabe daqui a um tempo você não conte. Mas hoje, você vai fugir enquanto pode de ouvir "eu bem que te avisei".


Não deveria ser tão difícil falar aos nossos amigos, aquelas pessoas que escolhemos amar e com quem dividir os momentos da nossa vida, sobre nossos fracassos. Por que essa dificuldade de falar da nossa dor, quando sabemos que tanta gente, tantas vezes, já sofreu como a gente, e já fez tanta besteira igual a gente? O medo do julgamento existe porque já julgamos, um dia. Já apontamos o dedo na cara de quem sofria, e por mais que tivéssemos avisado, por mais idiota que tenha parecido esse sofrimento, doeu, e mesmo assim, julgamos. Quando a gente desdenha do sofrimento alheio, esquece que um dia chega a nossa vez, e quando chega, a gente inventa história e acaba mudando a verdade.


Seria tão mais fácil se simplesmente pudéssemos chorar todas as feridas que estão abertas. Os amigos são o merthiolate e as gazes pra poder sarar e tapar nossas dores, enquanto elas não cessam. A função do ombro não é apontar as falhas, por mais que aponte, afinal amigo que é amigo não consegue assistir o barco do outro afundando sem fazer nada, sem avisar onde estão os furos, sem oferecer a mão pra sair de lá. Mas independente do naufrágio, é preciso superar tudo isso. É preciso que nossos amigos não criem uma história, não pra gente. Que eles saibam que tentamos avisar, mas se eles precisavam sofrer aquilo tudo, que assim seja. Que eles saibam, mais ainda, que estaremos sempre aqui, pra ouvir qualquer uma das histórias que ele queira nos contar - principalmente a verdade.

Um comentário:

Victor Almeida disse...

É ninoka, essas coisas que acontecem, são inevitaveis, infelizmente temos que lidar com isso sempre , mas foi o que você disse: "afinal amigo que é amigo não consegue assistir o barco do outro afundando sem fazer nada, sem avisar onde estão os furos, sem oferecer a mão pra sair de lá. E eu , mais do que ninguem, posso comprovar que isso ajuda muito. claro, tem aqueles "amigos" que sempre irão te criticar de alguma forma. mas o que levamos disso é a Experiência pra outro Namoro e assim vai.. ! Ótimo tema , parabéns!

Um Beijo!

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