segunda-feira, 10 de outubro de 2016

Você vê que é hora

Você vê que é hora de largar a toalha quando a luta tá mais sangrenta do que suada. Porque não precisa estar fácil; porque às vezes a gente sangra mesmo, faz parte. Mas não é pra ter hemorragia. Se tiver, é emergência. E a intervenção só pode ser durante o sangramento. Depois é cura. Não pode mais ser luta. Aí você deixa o ringue.

Você vê que é hora de largar o osso quando nem sente mais o gosto da carne. Às vezes demora pra notar porque o gosto já ficou no paladar. A gente se acostuma ao que já foi bom, ao que existia. Porque com o tempo, muda, mas continua existindo. Continua sendo bom, mesmo que de outra forma. Mas só o osso? Sem nem sinal da carne? Larga.

Você vê que é hora de ir embora quando sua presença já não é mais esperada. Quando não tem ansiedade, sorriso ou novidade pra contar. Vê que é a hora quando a vontade já não é visível nem sentida. Quando não se sente mais querido, é só um amigo, ou talvez nem isso. Sai. Vai.

Você vê que é hora de fechar a porta quando o lado de dentro nem se mexe. Não faz mais questão. Porque já não faz diferença. E não quer que faça. Você percebe que a vontade de não ir é mão única, e faz dessa falta de reciprocidade uma vontade ainda maior de fechar e deixar a chave por baixo da porta - porque você não vai mais voltar.

Você vê que é hora de não olhar pra trás quando vê que a toalha ficou lá mesmo. O osso, também. Você foi embora e não teve pedido pra voltar. A porta não abriu, a chave não foi devolvida. É hora de não olhar pra trás porque não é lá que está a sua vida. Não mais. É hora do foco, da força e quem sabe da fé de onde quer que esteja sua auto estima: você vê que é hora de largar o que já não é amor.

Nina Lessa (2016)

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