Vó

Não tem religião que conforte o 'nunca mais'. 

É por isso, Vó, que eu fico com as lembranças de você barulhenta e gritando, vindo dormir na casa dos seus filhos e netos trazendo suas malinhas, fazendo seus crochês e sentando em cima das nossas almofadas.

É por isso que eu prefiro continuar achando sua macarronada a melhor do mundo e ai de quem contrariar isso. Ainda amo o cheiro do molho, do seu leite de rosas depois do banho e do seu talco sempre em dia.

Vou ficar com a saudade de você ligando pra gente e reclamando que nunca damos o recado pros nossos pais de que você ligou - e geralmente você estava certa, como toda avó que muito bem conhece o neto que tem.

Fico com as frases prontas de "Deus te crie" quando espirramos, "dorme com Deus e com os anjos, amém" SEMPRE que nos falávamos à noite - hora em que, diariamente, rezo o Santo Anjo do Senhor, a primeira reza que aprendi - que você ensinou.

É por isso, Vó, por 27 anos de você me dizendo que nunca como feijão, que preciso cortar o cabelo direito porque pareço uma Maria Mijona com esse troço liso demais pra trás da orelha: hoje, eu uso o cabelo mais solto por sua causa.

Te vi deitadinha hoje, Vó, mas era esperando que você levantasse a qualquer momento pra assustar a gente. Era esperando suas unhas batendo na porta, como quando você fazia toda vez que vinha nos visitar, lembra?

Ainda estamos tristes, Vó, mas é porque você vai deixar uma saudade imensa - você tinha menos de um metro e sessenta, mas era imensa onde quer que fosse, e sempre deixava um silêncio imenso quando ia embora.

A gente não gostou do silêncio que ficou, sem você aqui.